sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Lya Luft (Mulher na Literatura)


 
Essa tradutora e escritora gaúcha, de família alemã, desde adolescente se mostrou "desobediente" e contestadora. Sempre foi ávida leitora. Diplomou-se em Pedagogia e Letras. Traduziu diversas obras do Inglês e do Alemão para o Português. Escreve artigos para a revista semanal Veja.
É autora de diversos livros como os romances AS PARCEIRAS (1980), A ASA ESQUERDA DO ANJO (1981), REUNIÃO DE FAMÍLIA (1984), EXÍLIO (1987) e o livro de poemas O LADO FATAL (1989). Em 1996 lançou O RIO DO MEIO (ensaios) que foi considerado a melhor obra de ficção daquele ano. No total, já escreveu e publicou 23 livros, entre romances, coletâneas de poemas, crônicas, ensaios e livros infantis.
Como Lya Luft se define: 

"Sou fascinada pelo lado complicado. Tenho um olho alegre que vive: sou uma pessoa despachada, adoro família, adoro a natureza. Mas eu tenho um outro olho que observa o lado difícil, sombrio. A minha literatura nunca vai ser "aí casaram e foram felizes para sempre". Minha literatura sempre nasceu do conflito, da dificuldade, do isolamento".
—Lya Luft

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CONVITE

Não sou a areia
onde se desenha um par de asas
ou grades diante de uma janela.
Não sou apenas a pedra que rola
nas marés do mundo,
em cada praia renascendo outra.
Sou a orelha encostada na concha
da vida, sou construção e desmoronamento,
servo e senhor, e sou
mistério

A quatro mãos escrevemos este roteiro
para o palco de meu tempo:
o meu destino e eu.
Nem sempre estamos afinados,
nem sempre nos levamos
a sério.
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CANÇÃO EM SEGREDO

Dentro desta mulher
um anjo menino
brinca de ciranda na calçada
e tem fome de futuro.
Dentro desta mulher
uma criança se debruça na janela
vendo chegar o amor
e se julga imortal.

Dentro desta mulher
uma guerreira constrói sua vida
depois de parir filhos para o mundo.
Dentro desta mulher
outra mulher enterra o seu amor perdido
e mesmo assim espera.

Dentro desta mulher
o mistério das coisas
finge dormir.  

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MATURIDADE

Caminho entre as minhas perdas
que são insetos escuros,
e os meus ganhos: douradas borboletas.

A luz de uma paixão, o dedo da morte,
o grave pincel da solidão
desenharam meus contornos, firmaram
meu chão.

Que liberdade, não precisar pensar;
que alívio não ter de administrar
minha vida:
apenas andar, e olhar,
apenas ouvir essas vozes
que vêm de longe, passam por mim
e não me dão importância.

Porque no vasto oceano,
a minha eventual desarmonia
é só uma gota
desafinada.
Mais nada.

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AUTO RETRATO

Alguém diz que sou bondosa:
está tão enganado que dá pena.
Alguém diz que sou severa,
e acho graça.
Não sou áspera nem amena:
estou na vida como o jardineiro
se entrega em cada rosa

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O LADO FATAL XV

Não falem alto comigo:
andem sempre na ponta dos pés.
Principalmente, não me toquem.
Finjam que não vêem se tenho um jeito absorto,
se nem sempre entendo as perguntas
com a rapidez de antigamente,
se pareço fatigada
e sem graça como nunca fui.
Façam silêncio ao meu redor.
Não me interessa nada o cotidiano nem o místico.
Não quero discutir o preço do mercado
nem os grandes mistérios da eternidade.
 

 

Obra poética de Lya Luft aqui 
Baixar o livro O MAR DE DENTRO aqui

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