quarta-feira, 26 de agosto de 2015

Poesia na Feira de Trocas


Em tempos em que as pessoas valem pelo que podem consumir, um encontro para a troca de objetos e saberes acaba sendo também um convite para discutirmos a contracultura.

Em julho deste ano, dois escritores do Clube, Douglas Tomaz e Calyanne Gonçalves organizaram uma feira de trocas numa praça da cidade. A ideia era realizar um escambo livre e não oneroso entre as pessoas. Foram realizadas oficinas, rodas de conversa, troca de livros, aula de Yoga, entre outras coisas. 
Muitas pessoas compareceram no local e puderam experimentar a sensação da liberdade de intercambiar mais do que coisas, mas saberes, canções, abraços, ideias, poemas. Alguns escritores do Clube recitaram, cantaram, expuseram no varal de poesia.


Duas publicações muito especiais foram lançadas durante a Feira de Trocas: 
Escorre, de Douglas Tomaz
Gaia, de Calyanne Gonçalves
São coletâneas de textos poéticos impressos pelos autores em pequena tiragem, especialmente para serem trocados durante a feira.
Ao escolherem lançar suas produções independentes na feira de trocas, os autores acrescentaram aos objetos que os leitores levaram para casa um valor que vai além do material. O afeto e os sentimentos estão nos versos, no livro-objeto e no abraço que selou cada transação.

Eis alguns poemas compartilhados pelos autores:

Dissolve

par de sapatos se desfaz enquanto caminha
passo a passo partes se soltam
sola
cadarço
por instantes o chão se abre
diluído
morre lentamente
lugar onde pisa
sapatos
pés
sensação de firmeza
morre lentamente
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Contrato

cláusula
desconstruir palavra
ordem
matar palavra
homicídio
palavra morreu
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Correio elegante

Enviou-lhe um coração de
papel vermelho
vermelho e vazio
vazio para que inscrevesse
tudo

após silêncio, escreveu
não te amo
no coração devolvido

(poemas do livro Escorre, de Douglas de Oliveira Tomaz)
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Cicatriz

Cica                                  
Fica                         
Caça                
Trouxa
Você atriz, eu
ferida.
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Ser de peixes


Ser de peixes,
manjar que mata
minha fome, água
que finda a
minha sede,

se for peixe de
oceano me faço
porto para te
aconchegar
se for de rio me
faço pescador
para te pescar

se for de lago
me faço crianças
para te observar

mas, se peixe
virar gente, me
faço mulher para te amar.

(poemas do livro Gaia, de Calyane Gonçalves)