sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Poema para os poetas da minha cidade

Na minha cidade somos todos poetas!
Cedo o galo canta tecendo a manhã
E vamos viver o cotidiano como deve ser
Pois não há aqui nada de diferente
A não ser o fato de sermos todos poetas.
O padeiro é um poeta
Rabisca versos no papel de pão
Por isso é mais lido pelas manhãs...
O empresário é um poeta
Embora ocupado no ofício
De sempre bater a meta
Libertou-se da métrica
H
O
J
E
Faz
Poesia
Concreta.
Se há crimes
São todos passionais
E a cada delito o meliante
Deixa em versos sua confissão.
Vai a júri onde o advogado
Faz em rimas decassílabas
A defesa do réu poeta.
A sentença é proferida
Em sextilhas ou redondilhas.
E o juiz, que é poeta,
Usa quadras de cordel
E declama desenvolto
Dando a sentença ao réu.
As putas cobram o dobro
Se o cliente faz rimas ricas.
Nos becos os travestis
Conjugam o verbo erotizar
Sem simbolismo ou romantismo
Criando textos dadaístas
Em sentido figurado.
Outras figuras noturnas
Fazem poesia marginal
Enquanto na gráfica
Imprimem o jornal
Narrando os fatos
Em sonetos, odes e poemas épicos
Que retratam a vida agitada
Da cidade onde só uma coisa é certa:
Leis, notícias, cartas de amor,
Discursos de políticos,
Lição de matemática,
Teses de mestrado,
As palavras de um profeta,
Manuais de instruções,
Tratados de paz,
Declaração de calamidade pública,
Bula de remédio,
Receita e regras de dieta
É tudo subjetivo
E com licença poética.
Cada criança que nasce
Em vez de certidão de nascimento
Recebe do tabelião,
Que é poetiza ou poeta,
Um documento oficial
Que confere ao cidadão
Por lei rimada e irrevogável
O direito de pensar
E de viver como poeta.
(Rafael Oliveira, 16/01/2014)

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