segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

Hilda Hilst (Mulher na Literatura)















Exercício no 1
Se permitires
Traço nesta lousa
O que em mim se faz
E não repousa:
Uma Idéia de Deus.
Clara como Coisa
Se sobrepondo
A tudo que não ouso.
Clara como Coisa
Sob um feixe de luz
Num lúcido anteparo.
Se permitires ouso
Comparar o que penso
O Ouro e Aro
Na superfície clara
De um solário.
E te parece pouco
Tanta exatidão
Em quem não ousa?
Uma idéia de Deus
No meu peito se faz
E não repousa.
E o mais fundo de mim
Me diz apenas: Canta,
Porque à tua volta
É noite. O Ser descansa.
Ousa.
HILDA HILST, que provocou choque de costumes comportando-se de maneira ousada e provocadora, manifestou-se em público em favor da liberdade feminina tanto no âmbito profissional e artístico como no âmbito amoroso e erótico. Ela esperava se tornar uma excelente pornógrafa e recusava o feminino poetiza, por associá-lo à imagem de moça frágil.
Na década de 90, em uma entrevista concedida a TV Cultura, fez-se a seguinte pergunta para ela: Agora, Hilda, a uma mulher é permitido escrever pornografia?
Hilda respondeu: ‘’não é permitido, mas eu acho que a verdadeira natureza do obsceno é a de converter. ’’
(por David Nascimento)

FILÓ, A FADINHA LÉSBICA
Ela era gorda e miúda.
Tinha pezinhos redondos.
A cona era peluda
Igual à mão de um mono.
Alegrinha e vivaz
Feito andorinha
Às tardes vestia-se
Como um rapaz
Para enganar mocinhas.
Chamavam-lhe "Filó, a lésbica fadinha".
Em tudo que tocava
Deixava sua marca registrada:
Uma estrelinha cor de maravilha
Fúcsia, bordô
Ninguém sabia o nome daquela cô.
Metia o dedo
Em todas as xerecas: loiras, pretas
Dizia-se até...
Que escarafunchava bonecas.
Bulia, beliscava
Como quem sabia
O que um dedo faz
Desde que nascia.
Mas à noite... quando dormia...
Peidava, rugia... e...
Nascia-lhe um bastão grosso
De início igual a um caroço
Depois...
Ia estufando, crescendo
E virava um troço
Lilás
Fúcsia
Bordô
Ninguém sabia a cô do troço
Da Fadinha Filô.
Faziam fila na Vila.
Falada "Vila do Troço".
Famosa nas Oropa
Oiapoc ao Chuí
Todo mundo tomava
Um bastão no oiti.
Era um gozo gozoso
Trevoso, gostoso
Um arrepião nos meio!
Mocinhas, marmanjões
Ressecadas velhinhas
Todo mundo gemia e chorava
De pura alegria
Na Vila do Troço.
Até que um belo dia...
Um cara troncudão
Com focinho de tira
De beiço bordô, fúcsia ou maravilha
(ninguém sabia o nome daquela cô)
Seqüestrou Fadinha
E foi morar na Ilha.
Nem barco, nem ponte
O troncudão nadando feito rinoceronte
Carregava Fadinha.
De pernas abertas
Nas costas do gigante
Pela primeira vez
Na sua vidinha
Filó estrebuchava
Revirando os óinho
Enquanto veloz veloz
O troncudão nadava.
A Vila do Troço
Ficou triste, vazia
Sorumbática, tétrica
Pois nunca mais se viu
Filó, a Fadinha lésbica
Que à noite virava fera
E peidava e rugia
E nascia-lhe um troço
Fúcsia
Lilás
Maravilha
Bordô
Até hoje ninguém conhece
O nome daquela cô.
E nunca mais se viu
Alguém-Fantasia
Que deixava uma estrela
Em tudo que tocava
E um rombo na bunda
De quem se apaixonava.
(HH, Bufólicas, 1992)

Livros de Hilda para download A obscena senhora D
                                                 O Caderno Rosa de Lori Lamby
                                                 Obra poética reunida

Um comentário:

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